Pais e filhos
Uma história alicerçada no amor
Foi no evento Caminhada a Favor da Adoção, realizada em Pelotas, que Marcus e Débora Spohr tiveram contato com Steven, 17 anos, adotado pelo casal e hoje irmão do pequeno João
Paulo Rossi -
Os rostos se aproximam para foto, a alegria extravasa e, de fundo, uma convicção: o tempo foi o de Deus. Aquela manhã do domingo, 19 de novembro, era apenas de participação na Caminhada a Favor da Adoção. Mas foi muito além. Iniciava a ser escrita ali, na avenida Dom Joaquim, uma bela história de amor. O pequeno João, então com cinco anos de idade, ganharia um irmão. E foi assim que a família Spohr encerrou o 2017 e cruza para o 2018: maior e mais feliz.
Foi tudo muito mágico. Um caminho cheio de pequenos sinais. Sutis. Há pouco mais de um ano, o casal Marcus e Débora Spohr começara a amadurecer a ideia de ter mais um filho. Desta vez, abririam o coração para uma adoção tardia; um menino ou uma menina com idade mais avançada. E foi com base nesta decisão que em 2016 tiveram acesso - através do Juizado da Infância e da Juventude - a um vídeo com depoimentos de todos os adolescentes que aguardavam o acolhimento de uma família, em Pelotas.
Começava a contar, daquele dia em diante, a gestação de Steven Luiz. A descoberta de que uma amiga havia sido professora do guri de sorriso largo. A revelação, também através de amigos, de que professavam a mesma fé. Aos poucos, mesmo a distância, o mosaico da vida ganhava novos encaixes.
Só faltava o encontro. Só faltava se conhecerem. E foi o que ocorreu, claro, naquela manhã ensolarada. Sem formalidades nem pré-agendamento. Foram menos de dez minutos de contato. O suficiente para o espontâneo João estender as mãos a Steven, como se o vínculo já existisse. “Tínhamos acabado de ser apresentados ao Steven através de amigos. Quando olhamos o João de mãos dadas com ele foi a confirmação de que devíamos dar mais um passo”, conta o jornalista Marcus Spohr, 38.
E foi exatamente o que fizeram. Na segunda ligaram ao Foro. Na terça foram até lá e, a partir de quarta-feira, iniciavam uma série de três encontros com o adolescente no próprio Juizado. No sábado, menos de uma semana depois, Steven recebera autorização da Justiça para passar o final de semana com eles. Aliás, o primeiro de muitos. A família deu início à papelada e, desde 14 de dezembro, o casal já está com a guarda provisória.
“São filhos muito desejados. Não temos dúvida de que foram gerados no nosso ventre espiritual”, destaca a mãe, a cabeleireira Débora Spohr, 35.
Inúmeras razões para celebrar
O bate-papo com o Diário Popular ocorreu na noite do último dia 28, quando haviam terminado de chegar da viagem à pequena Alecrim, no noroeste do Estado, onde ainda vivem familiares de Marcus. Foram quatro dias com razões de sobra para celebrar. O Natal. O Ano-Novo que estava por vir. O “nascimento” do novo neto, comemorado em dose dupla. Em 26 de dezembro Steven completaria 17 anos, com direito a quatro Parabéns a você; o primeiro, ainda de manhã, cantado ao violão pelo pai.
Foram dias para enchê-lo de mimos, de agrados e de delícias, como o à la minuta preparado pela vó Cristina. Em Pelotas, não tem sido diferente. A vó Zilda também exibe o toque do seu tempero. É um tanto de aconchego. Uma acolhida que o faz deixar para trás a indagação que costumava rasgar a mente, como contou ao DP dois dias antes da Caminhada da Adoção: “Será que o problema sou eu ou a minha idade?” - questionava-se ao longo dos quase seis anos vividos no abrigo.
Ao conversar agora, na sala de casa, Steven Luiz busca palavras para resumir a vida nova. “Hoje tenho um pai, uma mãe. Uma casa. Um quarto. Uma cama. Tenho tudo”, afirma e sorri. E ao projetarem o futuro, juntos, em família, amadurecem um conceito: é possível, sim, escrever uma nova trajetória. Um novo caminho. Mais leve. Alicerçado em amor e respeito.
E, nesse redesenho, o adolescente faz questão de mudar de nome. Já defendeu a ideia aos pais. Ao receber a nova certidão, nos próximos meses, portanto, passará a se chamar Estêvão Marcos Crizel Spohr; o filho mais velho de Marcus e Débora. O mano de João. Um guri determinado a fazer a diferença. “A adoção não é caridade. Não é boa ação. O Steven foi gerado por Deus, que o encaminhou a nós no tempo certo”, reforça o jornalista.
A posição do Juizado
A juíza da Infância e da Juventude, Alessandra Couto de Oliveira, garante: é a disponibilidade afetiva em exercitar a maternidade e a paternidade o principal aspecto a ser observado durante a análise psicológica e social de quem pretende adotar. E é também ancorada na máxima de que ninguém ama quem não conhece, que a magistrada tem proporcionado encontros entre os adolescentes aptos à adoção em Pelotas e as pessoas - já habilitadas - que pretendem abrir-se à adoção tardia.
“Acredito muito no olho no olho. Na empatia que se estabelece quando as pessoas se conhecem”, enfatiza. E adianta: em maio, quando se celebra o mês da Adoção, uma nova Caminhada deve ser realizada. São eventos e estratégias que ajudam a dar visibilidade ao tema.
Nos últimos anos, no Brasil inteiro, o Juizado tem revisado os métodos de ação e permitido que esses contatos - até então barrados - existam. Antes, o próprio zelo pelas crianças e adolescentes, sob a tutela do Estado, acabava por torná-los invisíveis à sociedade - avalia Alessandra. Não raro se deparavam - e ainda se deparam - com os 18 anos de idade, do lado de dentro do abrigo. Do lado de fora, um futuro de incertezas. Mas são histórias de vida que podem mudar. Basta uma decisão, um encontro e dois corações pulsarem.
Confira a documentação para dar início ao processo de habilitação à adoção (*)
-Cópias autenticadas de certidão de nascimento ou casamento, ou declaração de união estável;
-Cópias da carteira de identidade e do CPF;
-Comprovante de renda e domicílio;
-Atestados de sanidade física e mental (expedidos por qualquer médico, independentemente da especialidade);
-Certidão judicial criminal negativa de 1º grau;
-Certidão judicial cível negativa de 1º grau;
-Foto dos pretendentes (individual ou casal)
(*) Não há qualquer restrição no caso de pretendentes à adoção solteiros ou casais homoafetivos
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